Como o afeto se faz presente em
nossas vidas? Essa a pergunta que Greta
Gerwig tenta responder com seu novo trabalho. Adoráveis Mulheres começa
apontando uma citação de Louisa May
Alcott, autora do romance que originou sua quarta adaptação para o cinema: “Eu tive muitos problemas, então escrevo
contos alegres”. É isso que câmera procura insistentemente em cada quadro
do filme, por amor, carinho e bons momentos que passam desapercebidos mediante
a todo caos e conflito que nos são impostos pela vida. Adoráveis Mulheres é uma
mensagem de infinita sensibilidade.
Jo (Saoirse Ronan) é a primeira das quatro irmãs que compõem a
família March a quem o filme nos apresenta. Ela vive numa pensão em Nova Iorque
e ganha a vida tentando publicar os contos e novelas que escreve para
periódicos, nota-se sua vontade e natureza sonhadora no olhar e no primeiro
diálogo. Amy (Florence Pugh), Meg (Emma Watson) e Beth (Eliza Scanlen) são mostradas logo em seguidas, junto de sua
mãe, Mary March (Laura Dern). É aí
então que a montagem de Adoráveis Mulheres começa a surpreender com uma
narrativa não-linear para contar como cada uma das irmãs chegou até o presente.
Amy vive na França, é pintora e ‘parece’
a melhor sucedida da família, Meg se
casou e já tem filhos, enquanto Beth
sofre acamada com escarlatina.
O passado revela que cada uma das
irmãs March, e não apenas Jo, tem uma veia artística pulsante, algumas mais que das outras. Meg é
uma belíssima atriz, enquanto Amy faz
desenhos e Beth sabe tocar piano.
Elas passam por dificuldades, da ausência do pai que luta na guerra civil e
também da falta de recursos para se manter uma família com tanta gente, mas usam
desses talentos para aquecer a casa, confraternizando entre si e criando
momentos harmoniosos. Isso chama a atenção da família rica e bem educada que
vive ali por perto... os Laurence.
Por retratar o período da Guerra
Civil Americana, mediante todas as dificuldades e situações, Adoráveis Mulheres não poderia deixar de
ser um drama de época, mas também sabe balancear sua história com o coming of age (gênero literário que
conta histórias de amadurecimento e transição da juventude para a idade adulta - é o que Lady Bird é, por exemplo). Greta encontra o equilíbrio perfeito
entre esses mundos ao buscar tomadas ensolaradas mesmo quando tudo está escuro.
Ao filmar sorrisos e alegria genuínas quando as coisas parecem perdidas... E
valorizar como os sonhos de cada uma das irmãs tem muito valor para o filme,
que cobre as aspirações artísticas e sentimentais delas, e também a diversão
íntima que cada uma sente enquanto faz sua própria arte ou simplesmente estão
juntas umas das outras.
A relação entre as irmãs mostra
como em algum momento elas se separaram e foram viver suas vidas, mas que são
unidas pelas lembranças e que por serem que são, podem buscar melhor usufruto
do que tem em sua melhor maturidade. A narrativa não-linear exerce um papel
importante. A medida em que as March
vão crescendo, sua concepção de vida e ideias também vão se transformando. Então,
fica perfeitamente compreensível o porquê de Greta intercalar presente e
passado não de maneira paralela, mas fazendo uma “costura” que favorece a
construção de cada uma das protagonistas, para que se entenda sua jornada até
os momento onde todas se encontram no final.
O que faz de Adoráveis Mulheres
um filme verdadeiramente, hmm... adorável, é o fato de ele modernizar sua história
prima de época sem se fazer explícito ou vulgar demais. Faz isso estabelecendo
laços com alguns dos desejos e vontades próprias do público dessa geração, com
um discurso doce. Isso inspira e mexe com quem, de alguma forma, procura esse
aconchego e otimismo. Antes de se casar, Meg profere uma sentença que ao mesmo coloca
em contraste o perfil de cada uma das irmãs e revela como essas diferenças
também são um elo: “Não é porque meus
sonhos são diferentes dos seus que isso significa que eles não importam”. Meg
March é obrigada a fazer escolhas entre destinos bem distintos, ela escolhe o
sonho do casamento por amor. Jo se mantém fiel ao que acredita e persiste, luta
e faz com que sua vontade se realize, Amy quando menos espera também é
surpreendida positivamente e passa a viver seu sonho; Apenas Beth é abatida
pela força da vida, o que acontece também na vida real... Deixando cicatrizes e
lembranças em cada uma das outras adoráveis mulheres.
Greta Gerwig encontra o amor nas
raízes de quem somos em nossa mais profunda intimidade, na companhia de quem
queremos por perto e na realização de nossos diferentes sonhos. Seu filme
acolhe e dá colo para quem precisa, isso é um feito enorme. Fazendo assim uma
adaptação profundamente autoral e perspicaz sobre como a vida pode insistir em
ser dura, especialmente para mulheres tão ambiciosas (no melhor sentido que a
palavra tem), mas mostrando que é possível vencer através do coração.