A elegância destrutiva de Trama Fantasma

Não dá para falar de Paul Thomas Anderson sem falar de seus protagonistas. Desde o final da década de 90, o norte-americano vem se estabelecendo como um excelente contador de histórias, e é através do estudo de personagem que ele desenvolve narrativas surpreendentes e admiráveis. Em seu oitavo longa, Anderson retorna a todo vapor, assumindo três cargos de grande importância: a direção, o roteiro e a fotografia.

Ambientado nos anos de 1950, Trama Fantasma é centrado no perfeccionista Reynolds Woodcock (Daniel Day-Lewis), que não está disposto a colocar nenhuma prioridade acima de sua brilhante carreira como estilista. Inflexível e um tanto excêntrico, ele se vê desafiado por Alma (Vicky Krieps), uma jovem não muito polida para sua rotina burguesa, mas detentora de uma personalidade tão forte quanto a dele. Os dois desenvolvem uma relação baseada num constante jogo de poder.

Em toda sua elegância, o estilista britânico ainda exibe a masculinidade tóxica característica dos protagonistas de Paul Thomas Anderson. Longe da ganância cega do petroleiro Daniel Plainview, em “Sangue Negro” (2007), ou da agressividade incontrolável de Freddie Quell, em “O Mestre” (2012), Reynolds Woodcock parece fechar uma trilogia de redenção ao apresentar momentos de vulnerabilidade tão intensos - e tão essenciais para a história. Nesses momentos, a direção de arte, incrivelmente atenta aos detalhes, deixa de lado os trajes finos encorpados para colocar o personagem em figurinos que parecem escondê-lo e oprimi-lo.

Não é a toa que o drama apresente as personagens femininas mais proeminentes da filmografia do diretor. Além de Alma, a grande mansão do estilista também abriga Cyril, a irmã apática que não agrega calor algum ao inverno londrino. A atriz Lesley Manville rouba a cena diversas vezes por ser a única capaz de domar a personalidade forte do protagonista. Juntas, as duas mostram como a petulância que Woodcock depende muito delas - e como elas podem facilmente destruí-la.

Essa não poderia ser uma despedida das telonas mais apropriada para Daniel Day-Lewis, que anunciou sua aposentadoria em junho de 2017. A obsessão do estilista pelos seus vestidos não fica muito atrás do trabalho do próprio ator, conhecido por se dedicar tanto aos seus personagens que se mantém neles até fora das gravações. A semelhança é tanta que, segundo declarações do próprio ator, Trama Fantasma foi um dos motivos para sua decisão de se aposentar. O filme também assumiu um tom pessoal para Paul, que disse ter se inspirado numa noite incomum com sua esposa, a comediante Maya Rudolph.

Na claustrofobia dos close-ups que dominam um dos dramas mais imersivos do diretor, vemos o potencial destrutivo de uma relação que parece começar num contexto amoroso, mas que se transforma em uma máquina imprevisível. Nesta segunda colaboração de Thomas Anderson com Day-Lewis, não é a brutalidade árida do Velho Oeste ou as engrenagens das bombas de extração de petróleo que estabelecem o tom de ameaça. É um suspense mais sutil, uma “morte silenciosa” que paira no ar.

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