15 séries que provam que o cinema está na TV


Cada vez mais o termo “cinematográfico” é atrelado às produções televisas, entretanto, apesar de parecer atual, o fenômeno do cinema na TV é muito mais antigo do que se pensa. Ele teve início na década de 50 com duas antologias: "Alfred Hitchock Presents" (1955-1962), que apresentava uma série de crimes sob a visão do brilhante diretor do suspense clássico, e "The Twilight Zone" (1959-1964), que consistia em diferentes histórias que misturavam terror, ficção científica e fantasia. As duas séries esquivaram-se do estilo tradicional de produção televisa para levar um pouquinho da magia do cinema para dentro de casa.

Com o advento da tecnologia e a ascensão de serviços de streaming, as séries voltam com a tendência de levar um conteúdo mais elaborado para as telinhas. Já que agora isso é uma necessidade comercial, os produtores estão cada vez mais ambiciosos!
Thandie Newton e Rodrigo Santoro em "Westworld", série da HBO idealizada por J.J.Abrams
O caso mais recente desse fenômeno foi a megaprodução da HBO, Westworld, idealizada por J. J. Abrams, um dos grandes nomes da ficção científica no cinema. O drama distópico foi vendido como “uma experiência cinemática” e teve um investimento de 100 milhões de dólares, se tornando mais um exemplo de que muito dinheiro envolvido tinha se tornado um sinônimo para o termo "cinematográfico". Isso saiu pela culatra na medida em que a série, apesar de sua narrativa complexa e efeitos especiais caros, não fugiu muito do padrão televisivo de direção e montagem, o que deixou a crítica especializada querendo mais.

Mas o que propriamente define esta aproximação do cinema com a TV? Seria uma direção inventiva, o nível de produção, proximidade técnica? Separamos uma lista de séries para refletir sobre os mais diferentes fatores práticos e culturais que nos parecem influenciar nesta categorização de uma série como cinematográfica. 

1) Twin Peaks

Mark Frost, David Lynch | ABC | 50 min | 1990-1991
O noir em alucinógenos dirigido por David Lynch e escrito por Mark Frost pode ser considerado o primeiro experimento cinematográfico da televisão contemporânea. O renomado drama policial abriu portas para diversas séries atuais que rompem com o modelo característico da TV. A produção foi pioneira em trazer uma espécie de mitologia densa, sombria e surreal que se baseia em anti-heróis para se desenvolver. Isso ecoa em várias séries contidas nessa lista, e até mesmo outras que não estão incluídas aqui, mas que são sucesso de opinião popular como Os Sopranos (1999-2007), Lost (2004-2010) e Mad Men (2007-2015).

2) Pushing Daisies

Bryan Fuller | ABC | 45 min | 2007-2009
“Cinematográfica” pode não ser a primeira característica que vem a mente quando pensamos em Pushing Daisies, mas basta uma olhada no visual da série que vemos o motivo para as doze indicações ao Emmy recebidas em 2008. A dramédia de Ned (Lee Pace), com seu dom de ressuscitar pessoas com o toque, criou sua própria estética e universo com um design de produção impecável e à moda antiga. 

Para começar, cenas externas eram quase impossíveis já que o mundo real fugia dos padrões do mundo da série. Então, quase todas as suas gravações foram feitas dentro de estúdios em cenários montados do zero. Além disso, nada de grandes efeitos especiais! A série tinha baixo orçamento. Várias vezes a paisagem no fundo da cena era, na verdade, uma pintura. Uma das inspirações para todo o clima da série, principalmente para a direção de arte, foi o filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001).

3) Breaking Bad

Vince Gilligan | AMC | 50 min | 2008 - 2013
Breaking Bad é quase universalmente aceita como uma série de qualidade. Ela usou de tudo: planos sequências, planos fixos e de longa duração chegando até a usar plano subjetivo de objetos inanimados - isso tudo sem perder sua essência e unidade. No entanto, o que revela o cuidado da produção com os detalhes é o que ficou conhecido como a Teoria das Cores. Não é preciso buscar muito longe na internet para achar um mapa detalhado de como cada cor influencia e acompanha a narrativa da série. Isso envolveu todos os setores do drama, desde a pré até a pós-produção, começando no roteiro, passando pela direção de arte e de fotografia e culminando no colorista que finaliza o tom estético pelo qual a série ficou conhecida. 

4) Game of Thrones

David Benioff, D. B. Weiss | HBO | 60 min | 2011 - presente
Além de ser o maior ícone da TV cinematográfica da atualidade, Game of Thrones é também a produção televisiva mais cara da história. Para se ter uma ideia do custo, só os dez episódios da sexta temporada custaram 10 milhões de dólares cada um! Os números impressionam: durante uma única temporada, a série chega a ter mais de 150 personagens, uma equipe técnica com aproximadamente mil membros e aproximados 5 mil figurantes, sem contar os eventuais cavalos – no ano passado, foram 70 para uma única cena. 

Cada temporada demora quase um ano para ser feita, já que elas são gravadas em cinco países, de forma quase simultânea, utilizando mais de 100 cenários diferentes. A série, em grande parte, se limita a um estilo de direção televisiva mais tradicional – mesmo que, olhando ao nível da produção, ele não seja tão tradicional assim - mas quando os diretores se abrem para experimentos com a câmera, o resultado é memorável. O drama medieval chegará ao fim neste ano, mas deixa um marco na história televisiva por ter sido a primeira produção dessa escala na TV.

5) Sherlock

Mark Gatiss, Steven Moffat | BBC | 90 min | 2011-presente
O maior atrativo da versão da BBC é que ela se mantém fiel aos clássicos de Sir Arthur Conan Doyle, mas não é apenas uma regurgitação. A série usa e abusa de elementos gráficos e visuais para adaptar as histórias ao contexto contemporâneo de forma criativa. A narrativa muitas vezes assume um tom psicológico que permite que a direção tenha liberdade para experimentar novos ângulos, sequências mais surreais e, até mesmo, ilustrações explícitas do que se passa na cabeça do famoso detetive. Cada episódio é uma megaprodução por si só, sendo apenas 3 por temporada, com 1h30 de duração - o que tem um custo alto pros fãs que têm que esperar o intervalo de dois anos entre uma temporada e outra.

6) Black Mirror

Charlie Brooker | Channel 4/Netflix | 60 min | 2011-presente
A expressão que dá nome à série se refere ao momento em que um computador se desliga e o usuário pode ver seu próprio reflexo ligeiramente na tela. Nada mais propício para essa antologia onde cada episódio, basicamente, é um filme diferente de média-metragem mostrando os sintomas perturbadores da nossa sociedade tecnológica.

A genialidade da série vai muito além das reviravoltas bem planejadas do roteiro. O desafio de construir um mundo distópico convincente completamente diferente em cada novo episódio é cumprido com sucesso, não só na escrita, mas em nível técnico. Esse feito se torna mais impressionante ao pensarmos que a estimativa de orçamento por episódio seja de apenas 2 milhões de dólares - o que é considerado, no cinema, um baixíssimo orçamento, digno de uma produção independente. Apesar de ganhar o selo “original” da Netflix pela distribuição atual, a série, na verdade, teve origem no canal britânico Channel 4 que parou de produzi-la na segunda temporada.

7) Hannibal

Bryan Fuller | NBC | 40 min | 2013-2015
Dos livros para as telonas e depois para as telinhas. Como uma receita complicada, Hannibal misturou com maestria terror psicológico, surrealismo e poesia; isso tudo sem perder a irreverência de Fuller, que também foi responsável por Pushing Daisies. A série do serial killer canibal construiu um tom grotesco e único que atingiu vários aspectos da produção, desde a direção ao design. Seja nos cortes suculentos de carne humana sendo preparada, nas cenas de assassinatos que mais parecem uma pintura renascentista ou, até mesmo, nos nomes dos episódios sempre relacionados à culinária de diferentes países, Hannibal sempre deixou a audiência com água na boca


8) House of Cards

Beau Willimon | Netflix | 50 min | 2013-presente
É fácil argumentar que esse popular drama político seja cinematográfico, o difícil é estabelecer exatamente o motivo. A direção, apesar de se ater ao básico, é considerada por alguns críticos como comparável ao cinema auteur, sempre com a preocupação de manter o protagonista de Kevin Spacey enquadrado no centro da tela enquanto os personagens estão em seu entorno. Ainda pode-se considerar as falas que muito remetem aos teatros de Shakespeare, a direção de arte como importante construção dos personagens e o caro figurino da protagonista Claire (Robin Wright). No entanto, o que mais chama a atenção é o que está atrás das câmeras. A liberdade de expressão que a Netflix deu à produção política atraiu grandes nomes do cinema para dirigem a série, entre eles David Fincher - responsável por sucessos como Clube da Luta (1999) e Garota Exemplar (2014) - que dirigiu os dois primeiros episódios.


9) True Detective

Nic Pizzolatto | HBO | 50 min | 2014 - presente
True Detective talvez seja o argumento mais convincente para o retorno do estilo neo-noir aos meios mais populares do audiovisual. A série antológica policial criou uma estética que persistiu mesmo com a mudança completa de temática na segunda temporada. O roteiro e a direção têm um pacto curioso de abandonar a ideia do protagonista puramente viril presente nos clássicos noir. Por diversas vezes, seja na câmera ou na montagem, a série se preocupa em contrastar os estereótipos do policial durão com os homens frágeis nos seus íntimos. A primeira temporada foi escrita inteiramente pelo criador Nic Pizzolatto e teve como principal inspiração o livro de contos sobrenaturais O Rei de Amarelo, de Robert W. Chambers, lançado em 1895 e que foi odiado pelos críticos da época por romper com o que era valorizado pela literatura. 

10) The Knick

Steven Sonderbergh | Cinemax | 60 min | 2014-2015
The Knick é um consenso entre os críticos como a série disparadamente mais cinematográfica da TV atual. O drama é sobre a vida de uma equipe médica no Knickerbocker Hospital, um estabelecimento real que existiu em Nova York por mais de um século, entre 1982 e 1979. Além de criador, Steven Soderbergh - ganhador de uma Palma de Ouro pelo filme "Sexo, Mentiras e Videotape" (1989) – também dirige, edita e faz a fotografia de todos os episódios. A genialidade de Soderbergh vem de fugir de elementos convencionais durante a produção e as filmagens, deixando até mesmo os atores no escuro em relação a determinados aspectos do roteiro. Em entrevista para a Vulture, a atriz Eve Hewson falou que muitas vezes só entendia o propósito de determinadas cenas e em torno de qual personagem elas giravam quando as via prontas na TV.

11) Penny Dreadful

John Logan | Showtime | 50 min | 2014-2016 
Fazendo uma releitura de grandes clássicos, a série britânica trouxe para as telinhas um terror que não tinha como única intenção assustar. Penny Dreadful se aventurou por uma Londres da era vitoriana com criaturas das trevas, mas não se ateve apenas ao sangue e a morte. 

Com uma cinematografia impecável, o roteiro se aprofunda em questões de nível sexual, filosófico e religioso, construindo dramas sensíveis que fogem da necessidade do susto. A direção de arte também ganhou elogios, tendo o veterano do cinema Jonathan McKinstry no comando. 

A série reviveu personagens da literatura, como o Doutor Frankenstein e Dorian Gray, usou elementos mitológicos como bruxas e vampiros e envolveu até mesmo o próprio Lúcifer, isso tudo numa trama com ótimas atuações e protagonizada por ninguém menos que Eva Green.

12) Fargo

Noah Hawley | FX | 50 min | 2014-presente 
As raízes de Fargo estão no cinema, no filme de mesmo nome dos renomados Irmãos Coen, que são produtores executivos da série. A produção não é um remake nem uma sequência ou conta uma história anterior ao filme, ela simplesmente se passa no mesmo universo cinemático dos Coen, sem conexões diretas com o longa-metragem. Ainda assim, Fargo se consolida com um estilo próprio e muito criativo, onde a direção experimenta e ousa diversas vezes, sem se sentir na obrigação de ter que mostrar necessariamente o que o espectador espera ver. Um exemplo disso é a marcante chacina em um dos episódios. Do lado de fora de um prédio com janelas espelhadas que nada mostram do interior a câmera acompanha os movimentos do atirador, enquanto tudo o que resta à audiência é o áudio. Junto com Hannibal, Fargo é a segunda série da lista que se espelha num longa-metragem para se construir e levanta um questionamento: se basear num filme pode ajudar a série a ter esse status de cinematográfica? 

13) BoJack Horseman

Raphael Bob-Waksberg | Netflix | 25 min | 2014-presente
Há muito se perdeu o paradigma de que os desenhos animados são direcionados apenas para o público jovem e, para suprir esse público-alvo maior, as produções tiveram que ser mais elaboradas. No entanto, BoJack Horseman quebra padrões dentro do seu próprio gênero ao não se tornar o estilo de produção humorística escrachada popularizada por sucessos como South Park e Uma Família da Pesada. A história de BoJack, um ator decadente de Hollywood em busca de um novo sentido na vida, impressiona por sua versatilidade no estilo visual e no roteiro, criando um drama bem intricado de dar inveja em muita séries live-action por aí. Vale ressaltar a metalinguagem da produção que sempre satiriza a própria indústria cinematográfica. 

14) Mr. Robot

Sam Esmail | USA Network | 50 min | 2015-presente
Muita se especula sobre o enquadramento curioso que a direção de Mr. Robot usa constantemente: mesmo que o plano seja aberto, opta por mostrar os personagens apenas do peitoral para cima – às vezes deixando só a cabeça do ator em cena. A teoria mais aceita é que o enquadramento reflete o teor psicológico da trama e busca afetar o espectador tentando deixá-lo tão desconfortável quanto o ansioso e depressivo protagonista. A série se liberta das amarras do modelo televisivo para criar uma ruptura que pode às vezes ser até incômoda para a audiência, mas cumpre seu papel e a deixa fabulando o motivo para tal estilo. Ironicamente ou não, o piloto de Mr. Robot estreou num festival de cinema, o SXSW, e ainda levou um prêmio pra casa.

15) Sense8

Lilly & Lana Wachowski, J. Michael Straczynski | Netflix | 60 min | 2015-presente
Sense8 é mais um exemplo de profissionais renomados do cinema migrando para as pequenas telas. A série é uma criação das mentes brilhantes por trás de Matrix em parceria com o responsável pelo breve retorno da pioneira The Twilight Zone nos anos 80. As irmãs Wachowski, como veteranas atrás da câmera, não se intimidam e gostam de brincar na direção da série, mesmo com os aspectos desafiadores da produção, filmada em oito países diferentes. A própria natureza do enredo – oito pessoas ligadas mentalmente - permite muitas peripécias, como a troca de atores em cena durante um plano sequência.

Sense8 ainda conta com o diretor de fotografia John Toll. Ele é ganhador de dois Oscars pela cinematografia dos filmes Lendas da Paixão (1994) e Coração Valente (1995) e ainda é responsável por outros sucessos como O Último Samurai (2003), Homem de Ferro 3 (2013) e o episódio piloto de Breaking Bad. Toll disse em entrevista que, pessoalmente, nunca viu grandes distinções no processo de criação para a televisão e para o cinema. Ele também ressaltou que a evolução tecnológica dos aparelhos de TV é um fator a ser considerado nessa mudança de dinâmica entre os dois tipos de produção. Se você ficou curioso pelos bastidores da série, você pode assistir o especial “Sense8: Criação do Mundo”, disponibilizado pela Netflix.

Bônus: Velho Chico

Benedito Ruy Barbosa, Edmara Barbosa | Rede Globo | 60 min | 2016 
Quem pensa que o fenômeno é só em nível internacional, enganou-se. Apesar da TV brasileira não ter nada que se assemelha às séries em relação ao formato, as novelas e minisséries também estão cientes da televisão cinematográfica. Os espectadores brasileiros tiveram uma surpresa no ano passado com a novela Velho Chico: a trama de famílias rivais através das décadas se preocupou com aspectos técnicos que muitas vezes não são prioridade no meio televisivo brasileiro.

O que mais chamou a atenção foi a direção de fotografia que criou uma textura e um clima únicos para a história que encantaram quem assistiu. Essa não é a primeira produção do cineasta Luiz Fernando Carvalho com grande aceitação popular. Além de sua passagem pelo cinema com o filme Lavoura Arcaica (2001), Luiz foi responsável pelas minisséries Hoje É Dia de Maria (2005) e Capitu (2008), que têm um estilo bem diferente das novelas usuais, e pelo grande sucesso O Rei do Gado (1996).

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