Os clichês e frustrações da adolescência no despretensioso Califórnia, de Marina Person

VJ da MTV entre os anos 1995 e 2011, Marina Person estreia na direção com o filme jovem Califórnia. Sua figura simpática e agradável nos adianta um resultado no mínimo interessante. 

Lidar com o universo jovem no cinema não é tarefa fácil. Muitas obras pecam por lançarem um olhar limitado, partindo para simplificações ou excessos, tentando defini-lo. E é ai que Califórnia encontra sua força. Person assume os habituais clichês que rodeiam esta fase. Ora, todos já vivemos isso. Eles estão lá: o grupo de amigas, o novato no colégio, que também é o estranho, a paixonite adolescente, as frustrações, festas. O longa, porém, foge sabiamente da tentativa de traçar um retrato definidor de uma geração - a trama se passa nos anos 80 - e funciona como um recorte na vida daqueles personagens.

O protagonismo feminino é de Estela (Clara Gallo), uma jovem que sonha visitar a Califórnia, onde mora seu querido tio com quem troca constantes cartas, com gravações em fita beirando a um diário. A personagem se mostra mais próxima e aberta que com os pais. Sua expectativa em visita-lo é frustrada ao saber que ele virá ao Brasil e o filme ganha contornos mais sérios ao lidar com o tema da AIDS, caro a esta época. Além de lidar com o tio debilitado, Clara também vive intensa fase de paixões e descobertas sexuais.

Despretensioso, Califórnia é verdadeiro com o público e com seus personagens, não tentando ser mais do que é, ainda que, por vezes, isto afete o resultado geral. Aqueles permanecem, em sua grande maioria, em uma confortável superfície, tendo pouco a acrescentar. O interessante trabalho de arte e figurino (muitos emprestados da própria Person) da vida e energia a obra. As cores, vivas e presentes, não se deixam seduzir por uma estética Malhação. E a trilha (ah... a trilha) não poderia ser menos atrativa. Por momentos, me perguntei se ela não se excedia, insistente em pontuar grande parte das cenas, com mudanças bruscas e repentinas, mas Person, sem permitir que o filme se torne um sucessão de clipes, consegue enxugar uma imensidão de possibilidades musicais dos anos 80 em uma playlist daquelas que queremos comprar o CD logo após a sessão. Tem The Cure, Joy Division, New Order, The Smiths, David Bowie.

Na abordagem do universo jovem, o Cinema Brasileiro nos apresentou recentemente uma pérola: As Melhores Coisas do Mundo (2010), da talentosa Laís Bodanzky. É inevitável relembrarmos ele com um sorriso durante a projeção. Caio Blat, inclusive, está presente nos dois e disse ter grande apreço em trabalhar com diretoras mulheres.

Marina Person desponta, a meu ver, como uma aposta. Seu próximo trabalho, se mais lapidado e com uma equipe ainda mais engajada, tem forte potencial para dialogar com os jovens e reaproxima-los das produções brasileiras. Sua experiência de 18 anos na MTV pode, e provavelmente irá, encontrar no cinema um campo fértil de expressões.


Veja o trailer:


Por Mateus Guimarães Borges
Filme visto na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

CALIFÓRNIA
Direção: Marina Person
Ano: 2015
Elenco: Clara Gallo, Caio Blat, Paulo Miklos, Virginia Cavendish
Gênero: Drama
País: Brasil

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