Magnólia – Revisitando o passado, encarando Medos e o Absurdo


O terceiro filme de Paul Thomas Anderson chega a seu vigésimo aniversário em 2019 ainda promovendo debates e conquistando novos e velhos cinéfilos.

Fazem vinte anos que uma safra incrível de filmes tomou as salas de cinema em todo o mundo. À beira da virada do milênio, alguns dos títulos mais significativos para a atual geração de cinéfilos vinha à tona com temáticas mais introspectivas e reflexivas – para o mundo e para a condição humana. Entre eles, temos Magnólia. Um dos filmes mais abundantes já realizados pela indústria de cinema norte-americana. E quando a palavra abundante é usada dessa maneira, é para representar toda a vida contida neste filme. A obra ainda proporciona uma enorme variedade de possíveis leituras e surpreende por sua ambição, por sua quantidade de camadas e por trazer impressões artísticas tão fortes de Paul Thomas Anderson, que mira na graça do acaso para sentenciar que a falta de sentido em nossa existência é o próprio sentido da existência em si.

Magnólia é um mosaico de histórias, formato comumente chamado de “painel”. Esse tipo de narrativa apresenta diversos personagens que podem se entrelaçar ou não - cada um deles se desenvolve paralelamente para de alguma forma se acolherem no final. No caso deste filme específico, os personagens têm marcas passadas e anseios comuns que giram em volta de suas relações humanas e a busca por algo que lhes traga conforto.


São oito histórias particulares, duas de personagens que confrontam a própria morte. Elas trazem chagas parecidas e buscam preencher suas vidas com algo mais, enquanto uma nona pessoa, Phil Parma, enfermeiro vivido por Philip Seymour Hoffman, se apresenta como contraste aos demais. Phil parece ter consciência de quem é e demonstra satisfação com seu lugar no mundo ao mesmo tempo em que uma correnteza de conflitos atinge a todos naquela chuvosa noite em Los Angeles. O filme também trata disso: de insegurança, incertezas e de como existem pessoas perdidas e insatisfeitas sob o disfarce da sociedade de aparências.

Nas palavras do próprio diretor em entrevista para o Charlie Rose Show, Magnólia é um filme sobre pais e filhos, sobre quem somos, como crescemos e somos afetados por nossas experiências em torno de tudo isso. Não atoa, PTA pega emprestada uma referência d’O Mercador de Veneza, peça de Shakespeare, que por sua vez é tomada da Bíblia: uma menção de que os filhos estão condenados a pagar pelos pecados dos pais. Assim, o diretor faz questão de apresentar todas as relações entre pais e filhos, sejam elas diretas ou indiretas, da maneiras mais asfixiante o possível, abusa de uma trilha sonora angustiante e uma câmera imparável para que isso seja feito.


Na sequência de abertura que já se tornou bastante conhecida, Ricky Jay, como narrador, apresenta três histórias sobre a influência do acaso na realidade: a primeira é um relato do New York Herald; Na segunda, temos uma nota do jornal Reno Gazette, de Nevada; Enquanto a terceira e mais conhecida é um caso contado numa academia forense para estudantes de direito. Essa sequência é determinante para a cadeia narrativa estabelecida pelo diretor, ela define as regras que o filme seguirá dali em diante e também determinará o destino a ser confrontado por cada um dos personagens.

As três histórias apresentadas na abertura estruturam o encontro da arte com a vida real no famoso evento inesperado do filme. É quando o acaso prova seu ponto na história: não existe controle sobre a continuidade das coisas e tudo que acontece sobre a Terra está submisso ao acaso. Esse evento e as catarses provocadas por ele diferenciam Magnólia da maioria absoluta dos filmes de grande circuito e altos cartazes. É nesse flerte com o absurdo que Paul Thomas Anderson rompe com as doces fórmulas as quais o público está acostumado e faz questão, e ainda nesse ato demonstra que como a vida do outro lado da tela, seu filme está exposto à forças maiores. Muitas vezes a vida conduz as pessoas pelo acaso, forçando-as a encarar situações que não estavam dispostas a enxergar. São situações absurdas em todas as escalas, que como dito no próprio filme, são sempre seguidas de algo como “coisas assim acontecem o tempo todo”. Pode ser que seja verdade, que coisas assim aconteçam mesmo o tempo todo, mas Magnólia valoriza a graça de cada um desses momentos. Na reinvenção pessoal que cada um deles proporciona e como cada um destes sopros de vida é uma oportunidade para romper com laços e dores, buscar uma vida condizente com quem se é e quem se deseja ser.


Completando vinte anos, é fácil cravar Magnólia como uma obra-prima. Há respaldo público e crítico para isso. Explanar o porquê de tanta aclamação é que é uma tarefa mais complexa. Por mais que o mundo tenha dado muitas voltas desde o lançamento do filme até os dias que passamos, ainda vivemos tempos onde as pessoas se encontram fragilizadas e mal resolvidas com suas próprias questões. Numa só obra, o autor condensa traição, arrependimento e, sobretudo, perdão e a dificuldade de se perdoar a alguém e até a si próprio. Faz isso de maneira frenética e quase que documental para que o espectador também experimente o filme da mesma maneira que os personagens - à flor da pele - para assim também sair transformado após os créditos rolarem.

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