O Som Diegético no Cinema

As funções do som no cinema vão desde comover o espectador a auxiliar no desenvolvimento da narrativa. Sua presença é tão importante que, caso seja usada de modo preciso, provoca o sentimento de aproximação na relação público-personagem.

Diegese é um termo que se refere ao mundo interno criado na história. Tudo que ocorre na ficção é verossímil porque está dentro do universo diegético do filme e faz parte da existência própria da narrativa. Ou seja, diegese é a realidade dos personagens, o meio em que vivem e como reagem aos acontecimentos, com naturalidade ou não.

Entendemos, portanto, o conceito de som diegético – ou simplesmente diegética – como músicas, barulhos ou ruídos e diálogos que fazem parte da ação do filme. Quando há um som de chuva, um personagem ouvindo o rádio, se toca um instrumento, dança uma música e até nos próprios diálogos o som é diegético, pois faz parte da percepção dos personagens e do universo da história. Assim sendo, quando existe uma voz de narração ou uma música da trilha sonora, o som é não diegético, podendo ser chamado também de extradiegético
Cena de Paixão à Flor da Pele, do diretor Paul McGuigan 
Tomamos como exemplo o filme Paixão à Flor da Pele (2004): depois de altos e baixos, o casal protagonista da história vivencia um reencontro, ápice sentimental que é regido ao som de "The Scientist", da banda Coldplay. A letra da música condiz inteiramente com o momento em que é tocada. Os personagens não a ouvem, ela faz parte apenas da trilha sonora, foi inserida na cena com o objetivo de completar o filme em um sentido emocional, logo o som é não diegético.

Muitas trilhas sonoras não têm só o intuito de intensificar emoções, podem exercer também o papel importante de dialogar de forma síncrona com a narrativa, dessa forma, a música age proporcionando uma continuidade no enredo. Pode ser pela letra - muitas compostas especificamente para determinados filmes - ou pela intensidade e velocidade da música, que podem servir de auxílio para a compreensão do público, mas também como um próprio spoiler, antecipando ou prevenindo o espectador para o que acontece a seguir - estratégia usada principalmente nos gêneros de terror e suspense -.
O Som ao Redor, vencedor do Grande Prêmio de Cinema Brasileiro 
O filme nacional de 2012, O Som ao Redor, é um grande modelo no que se refere ao som diegético. De uma forma inovadora, o longa é escasso de trilha sonora extradiegética, isso quer dizer que não há músicas voltadas apenas para o público. Os personagens contidos na história ouvem e interagem com os barulhos que os cercam, como reclamar do latido do cachorro ou diálogos que acontecem tendo como fundo o ruído de uma lavadora de roupas, por exemplo. O diretor Kleber Mendonça Filho transforma o som em um elemento narrativo, e o utiliza para conduzir a ação dos personagens. 
Cena de a Noviça Rebelde, em que os personagens Liesl von Trapper e Rolfe cantam juntos sobre o futuro da garota 
Musicais apresentam o som diegético realista da forma mais bem desenvolvida possível. A diegese do filme nos faz crer naquele o universo, e o ato de cantar e dançar torna-se natural, pois são as músicas que expressam a emoção e o contato entre os personagens. Por mais que o público também seja levado pela melodia – que constitui a trilha sonora -, a música faz parte do contexto fílmico, e só existe porque um personagem está cantando. Nos musicais, as canções são elaboradas para contextualizar, confidenciar ou narrar algum acontecimento ou sentimento, tornando-se fundamental para a compreensão da história. 
Chantagem e Confissão, de 1929, faz uso da técnica de som meta degético
Existe ainda uma subdivisão, o som meta diegético. É o caso dos flashbacks, sonhos e imaginário dos personagens, bastante usado para refletir um estado de espírito.

Hitchcock usa dessa ferramenta, talvez de forma pioneira, no filme "Chantagem e Confissão"(1929): a personagem Alice comete um assassinato usando uma faca. Tempos depois, sua consciência pesa pela culpa. Alice se sente perseguida, e até uma conversa banal que acontece à sua frente acaba sendo distorcida pela mesma e, perturbada com o acontecimento, a personagem para de prestar atenção no restante da conversa no momento em que uma outra personagem usa a palavra faca. Alice ouve apenas a repetição consecutiva das palavras “faca, faca, faca…”, o que retrata seu remorso. 

Mesmo na era do cinema mudo, as sessões contavam com a presença de orquestras e pianistas que tocavam ao vivo para acentuar a dramaticidade e envolver o público na emoção da história. Sendo diegético, não diegético ou meta diegético, o som completa e sempre completou as obras cinematográficas de forma singular, tendo a capacidade de guiar todos os espectadores juntos, mas gerando sentimentos únicos.
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