Crítica | Meu Amigo Hindu, de Hector Babenco

Hector Babenco é um nome imprescindível na cinematografia brasileira. Nascido na Argentina e naturalizado brasileiro, o diretor é responsável por obras como "Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia", "Pixote, a Lei do Mais Fraco", "O Beijo da Mulher Aranha", que lhe trouxe uma indicação ao Oscar e visibilidade mundial, e "Carandiru". "Meu Amigo Hindu" vem após um hiato de 8 anos - seu filme anterior, O Passado (2007), é uma coprodução Brasil/Argentina, com Gael Garcia e Paulo Autran, e assim como este último, abriu a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

O longa, de forte caráter autobiográfico - logo no início há uma citação afirmando "o que você vai assistir é uma história que aconteceu comigo e conto da melhor maneira que sei” - tem Willem Dafoe como protagonista, alterego de Babenco. Um cineasta face a face com a morte, em processo de quimioterapia e que realiza um transplante de medula.

Na sessão exibida na Mostra de São Paulo, foi apresentado antes do filme um Making Off com direção de Bárbara Paz, esposa de Babenco. Uma escolha um tanto quanto equivocada. Não faz sentido para mim assistir a ele antes do longa, uma vez que, ainda, há diversos spoilers, além de depoimentos que tendem a condicionar o olhar do espectador para o que ele assistirá em seguida. No entanto, é elucidativo.

O convite ao Dafoe - que se disse privilegiado pela oportunidade - veio em um jantar após a apresentação do ator na peça "The Old Woman" na capital paulista. Depois de ler o roteiro, aceitou o projeto. Como de costume, se entregou ao papel, oferecendo o seu melhor dentro das limitações e exigências do personagem, até mesmo fisicamente, em função de seu estado debilitado.

O filme se mostra uma sucessão de recortes desconexos, que se guiam pela degeneração e conflitos do protagonista. Aliás, tudo gira em torno desta figura que se confirma a todo momento arrogante, egoísta e narcisista - negando, inclusive, a própria doença. Se por um lado a primeira metade do filme funciona muito bem na construção desta degeneração causada pela doença - evitando uma dramatização arrastada, vem incisiva, sem delongas -, por outro, tudo em seu entorno soa pouco ou nada convincente. E dai pra frente tudo tende a piorar.

Grande parte do elenco parece existir apenas para satisfazer as necessidades do roteiro, ou cairíamos em um extenso monólogo. Personagens como o de Reynaldo Gianecchini caem de paraquedas sem saber muito bem o que fazem ali. Ao menos, um diálogo traz essa bela homenagem: "já pensou que nunca mais teremos um filme do Fellini?". A citação surge desconectada, mas é uma das que mais perto chega do êxito em prestar uma ode ao cinema, um dos pilares de Meu Amigo Hindu, referenciando tanto clássicos como Top Hat e Cantando na Chuva, como os próprios filmes do cineasta.

Em entrevista a UOL, Babenco afima que "Hoje, depois de ser muito assediado pela ideia de fim, meu único pedido à morte era que ela me deixasse fazer mais um filme. E esse é o filme que a morte me deixou fazer". Como com uma chance de renascer, o cineasta tenta externar em Meu Amigo Hindu algumas de suas inquietações, transitando também pelo lúdico com confabulações, mas a constante arrogância do personagem impossibilita que os pedidos de desculpa convençam, mais parecendo espasmos culposos que logo passam. Não poderia também deixar de citar a forma desrespeitosa como as mulheres - todas do filmes - são objetificadas e existem em função daquele.  


Citando seu pai, Babenco lembra que "não contar uma história é trai-la", e com isso retomo a mensagem inicial da obra, "conto da melhor maneira que sei", para dizer: você sabe e é capaz de mais, Babenco. Espero que esta péssima fase do cineasta passe, apesar dele não esboçar muito interesse em seguir adiante após seus próximo filme carioca.

365 Filmes +Conteúdo +Notícias +Produtos +Cinema

A 365 Filmes é um conjunto de ferramentas que juntas formam um espaço totalmente voltado para o cinema. Seja através do conteúdo do blog, das notícias nas redes sociais ou dos produtos de nossa loja exclusivamente criados para os amantes da sétima arte, nossa motivação é divulgar, incentivar e inspirar cada vez mais cinema.